Páginas

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

O POVO


O Povo – Eça de Queiroz

Há no mundo uma raça de homens com instintos sagrados e luminosos, com divinas bondades do coração, com uma inteligência serena e lúcida, com dedicações profundas, cheias de amor pelo trabalho e de adoração pelo bem, que sofrem, que se lamentam em vão.
Estes homens, são o Povo.
Estes homens estão sob o peso de calor e de sol, transidos pelas chuvas, roídos de frio, descalços, mal nutridos; lavram a terra, resolvem-na, gastam a sua vida, a sua força, para criar o pão, o alimento de todos.
Estes são o Povo, e são os que nos alimentam.
Estes homens vivem nas fábricas, pálidos, doentes, sem família, sem doces noites, sem um olhar amigo que os console, sem ter o repouso do corpo e a expansão da alma, e fabricam o linho, o pano, a seda, os estofos.
Estes homens são o Povo, e são os que nos vestem.
Estes homens vivem debaixo das minas, sem o sol e as doçuras consoladoras da Natureza, respiram mal, comendo pouco, sempre na Véspera da morte, rotos, sujos, curvados, e extraem o metal o mineiro, o cobre, o ferro, e toda a matéria das indústrias.
Estes homens são o povo, e são os que nos enriquecem.
Estes homens, nos tempos de lutas e crises, tomam as velhas armas da Pátria, e vão, dormindo mal, com manchas terríveis, à neve, à chuva, ao frio, nos calores pesados, combater e morrer longe dos filhos e das mães, sem ventura, esquecidos, para que nós conservemos o nosso descanso opulento.
Estes homens são o Povo, e são os que nos defendem.
Estes homens formam as equipagens dos navios, são lenhadores, guardadores de gado, servos mal retribuídos e desprezados.
Estes homens, são os que nos servem.
E o mundo oficial, opulento, soberano, o que faz a estes homens que o vestem, que o alimentam, que o enriquecem, que o defendem, que o servem?
Primeiro, despreza-os; não pensa neles, não vela por eles, trata-os como se tratam os bois; deixa-lhes apenas uma pequena porção dos seus trabalhos dolorosos; não lhes melhora a sorte, cerca-os de obstáculos e de dificuldades; forma-lhes em redor uma servidão que os prende e uma miséria que os esmaga; não lhes dá proteção; e, terrível coisa, não os instrui: deixa-lhes morrer a alma.
É por isso que os que têm coração e alma, e amam a justiça, devem lutar e combater pelo Povo.
E ainda que não sejam escutados, têm na amizade dele uma consolação suprema.

Eça de Queiroz

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Ação de Indenização contra transporte terrestre




Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz do .... Juizado Especial Cível da Comarca de Manaus – AM.


Ação de Indenização por Danos Morais

Processo n°

Requerente: Vanderley Almeida Clarindo

Requerida: TRANSMANAUS – TRANSPORTES URBANOS MANAUS SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO LTDA.

VANDERLEY ALMEIDA CLARINDO, Brasileiro, solteiro, Estagiário de Direito, RG xxxxxxxx (SSP/AM), CPF xxxxxxxxxx, residente e domiciliado à Rua xxxxxxxxx – Manaus - AM, CEP 69099-262, com escritório profissional na Avenida Constantino Nery, 2610, - Flores, CEP 69058.795, Manaus - AM, Telefone xxxxxxx, onde recebe avisos e Intimações, vem face a Vossa Excelência, com respeito e acatamento, propor a presente ação de

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

em face de TRANSMANAUS – TRANSPORTES URBANOS MANAUS SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO LTDA., CNPJ Nº 09.057.718/0001-99, estabelecida nesta cidade na Av. Rio Jutaí, nº 883, Sala 01, N. Sra. Das Graças, Vieiralves, pelos motivos, de fato e de direito, que passa a expor.

I - Dos Fatos

O Requerente contratou Serviço de Transporte com a Requerida por volta das 6:00 (seis horas) do dia 21/07/2010 e pagou com o seu cartão de vale-transporte (doc. 01), para transportá-lo do Bairro Cidade de Deus, onde reside, até o seu trabalho na avenida Constantino Nery, 2610 – Flores, por meio do coletivo n°10403274, que opera na linha de n° 448 – Cidade de Deus / Centro, que além da superlotação, culminou por parar abruptamente, devido a pane, na avenida Max Teixeira, exatamente às 6:30 (seis horas e trinta minutos), fazendo com que todos descessem do Coletivo, causando mais ônus e aborrecimento ao Requerente.


É fato que existe um acordo, entre as empresas permissionárias do Transporte Público na Cidade de Manaus, para coletar os passageiros dos ônibus que eventualmente derem pane. Ocorre Excelência, que no referido horário do sinistro, não havia lugar sequer para uma mosca adentrar os outros coletivos que passavam pelo local, de tão lotados que estavam. Alguns mais ousados, para não dizer “malucos”, arriscavam-se dependurados pelo lado de fora da porta dos poucos ônibus paravam no local.

Ressalte-se, desde já, que o Requerente não é usuário freqüente do Sistema de Transporte Público, ocorre que no referido dia, seu veículo particular (Fiat Tipo/94, placa LAE 0755) encontrava-se na oficina. Porém, nos dois dias que precisou utilizar esse serviço, de competência originária do Poder Público, mas a cargo da concessionária ora Requerida, teve a sua condição de ser humano abalada pelas condições em que foi transportado, em nada diferido do transporte de animais.

II - Do Direito

A atividade descrita, evidentemente, caracteriza-se por uma prestação de serviço prevista no Código de Defesa do Consumidor. De um lado, temos a fornecedora TRANSMANAUS – TRANSPORTES URBANOS MANAUS SOCIEDADE DE PROPÓSITO ESPECÍFICO LTDA e, do outro lado, o consumidor VANDERLEY ALMEIDA CLARINDO. A atividade exercida pela referida empresa é fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração (art. 3º, do CDC), caracterizando-se, assim, como prestação de serviço.

É importante atentar para o fato de que esse contrato (contrato de transporte urbano) é um negócio tipicamente de resultado, ou seja, deve ser executado na forma e tempo previstos, não havendo que se falar no acaso. O consumidor contrata o serviço para ser levado de um lugar a outro, em dia e horário combinados.

O CDC disciplina as hipóteses de má prestação dos serviços, ou até sua ausência, garantindo ao consumidor o direito de exigir, à sua escolha, a devolução do valor integral pago devidamente corrigido, a reexecução do serviço ou o abatimento do preço pago, conforme o caso (art. 20).

O Código em apreço garante, ainda, reparação dos danos materiais e morais advindos da má prestação ou ausência do serviço contratado (art. 14).

A qualidade do serviço prestado pela empresa TRANSMANAUS, durante o caos verificado nos horários de rush - seja pela pane nos já sucateados auto-ônibus, seja pela superlotação dos mesmos, ou qualquer outro motivo – foi pífia, absolutamente questionável, senão inexistente, o que fere o disposto no já referido artigo 14 do CDC.

Além disso, na hipótese de interrupção da viagem contratada, sejam quais forem as causas dos eventos, a empresa de transporte tem o dever de prestar atendimento no sentido de minimizar os danos suportados pelos consumidores.

Não bastassem todas essas infringência, a Requerida afrontou e continua afrontando o disposto no art. 1°, III, da CF, que trata do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, não se conhece dos motivos, porém, conclui-se que ainda é financeiramente viável para Requerida tratar os usuários do transporte público da forma como tratou o Requerente, haja vista que, no Município de Manaus, poucos são os consumidores que fazem valer os seus Direitos.

Os danos morais caracterizam-se pelo desgaste físico e psíquico anormal enfrentado pelo consumidor e devem ser reparados, conforme garantia constitucional, na exata proporção em que sofridos, vedada qualquer limitação contratual ou legal (art. 25 do CDC).

É o caso da presente Ação em que o Requerente chegou atrasado ao seu recém conseguido Emprego (doc. 02), causando má impressão aos seus Empregadores e fazendo com que se desdobrasse para cumprir as tarefas que lhe foram atribuídas nesse dia, tendo que dispor inclusive do seu horário de almoço para dar conta dos trabalhos, haja vista que o expediente das Varas nos Fórum, encerram-se às 15:00 horas.

O Requerente sentiu-se diminuído como ser humano, uma vez que foi transportado em condições desumanas, semelhante ao transporte de animais, ou melhor, pior que o transporte de animais, conforme se pode inferir do art. 4° da INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 13, DE 30 DE MARÇO DE 2010, do MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO:

“Art. 4º Os veículos transportadores devem atender aos requisitos para transporte de animais de forma segura e de acordo com os princípios de bem-estar animal, sendo limpos e desinfetados antes do carregamento no estabelecimento de origem e no estabelecimento de pré-embarque, sob a responsabilidade do transportador.” (grifei)

Além de não cumprir com o contrato de transporte para o qual foi contratada, a Requerida feriu a dignidade do Requerente ao submetê-lo às condições humilhantes a que foi transportado, durante o período que esteve no coletivo.

Quando o Requerente estava tirando as fotografias que ilustram a presente, foi inquirido por uma Senhora, que também estava no coletivo, quanto ao propósito das mesmas, ao ficar sabendo, desestimulou o requerente a intentar a Ação, dizendo que não adiantaria de nada, pois todos os dias quebram ônibus na Cidade de Manaus sem que os poderes públicos tomem alguma providência.

Indignado com a prestação do serviço que “recebeu” e inconformado com a ganância dos permissionários do transporte público municipal, em transportar as pessoas como bem entendem, resolve, o Requerente, provocar a jurisdição desse MM Juizo, para que se pronuncie a cerca do dano experimentando, majorando-o da forma lhe parecer justa, para que não só o Requerente perceba justa indenização, como também a Requerida sofra, pelo menos financeiramente, pelo dano que infligiu ao Requerente.

Sem dúvida, os fatos acima relatados não configuram mero aborrecimento, situação comum do quotidiano, mas de um transtorno enfrentado pelo autor que alterou todos os seus planos, causou-lhe grande desconforto e horas de desassossego, visto que dependeu de um serviço absolutamente mal prestado, cuja explicação nunca lhe foi fornecida, assim como os dados pessoais do Requerente junto ao SINETRAM, que provaria a relação contratual (doc 03).

Que não se alegue qualquer excludente de responsabilidade da Requerida, constantes dos incisos do artigo 14 do CDC, vez que a interrupção da prestação do serviço realmente aconteceu e o Requerente não deu causa a ela. Ainda, qualquer caracterização de caso fortuito ou força maior não deve atingir a relação jurídica mantida entre o consumidor e a empresa. Aquele contratou a prestação de um serviço desta; ela se beneficiou, através de remuneração, da contratação; é dela que o ressarcimento deve ser exigido.

Além disso, não se pode dizer que o Poder Público seria um terceiro, totalmente estranho à relação. De fato, existe uma cadeia na prestação do serviço. Primeiramente, o serviço é público e fornecido através de concessão. Em vista disso, arca a Requerida com a qualidade do serviço prestado, sua execução, assim como eventuais danos causados aos seus clientes, inerentes ao risco da atividade econômica assumido pela Requerida.

Por fim, é imperioso destacar que as falhas verificadas não surgiram agora. Vêm de longa data, não só pelos horários em que se tem constatado a ineficiência do serviço, mas também porque as panes nos veículos postos em circulação vêm se configurando há muito tempo. Desse modo, a situação de força maior ou caso fortuito não se verifica, já que o que a caracterizaria não surgiu no exato momento da prestação de serviço, é anterior. Na verdade, constitui a negligência de todo um sistema desatento para a correta e adequada prestação de um serviço público.

II – DO PEDIDO

Assim sendo, requer a V. Exa. a citação do réu para comparecer à audiência de conciliação a ser designada e, querendo, oferecer sua contestação oportunamente, sob pena de serem considerados verdadeiros os fatos alegados, esperando que ao final o pedido inicial seja julgado procedente, condenando-se o réu:

Indenizar o Autor por danos morais, em função de todo o transtorno suportado pelo autor, em valor a ser estipulado por esse MM. Juízo.

Requer também seja prestada assistência judiciária, nos termos do artigo 9o, I, da Lei no 9.099/95.

Requer, por fim, a inversão do ônus da prova, como previsto no artigo 6º, VIII, do CDC.

Requer Justiça Gratuita.

Da-se a causa o valor de R$ 10.200,00

Termos em que pede deferimento.

Manaus, AM, 07 de outubro de 2010.

__________________________________

Vanderley Almeida Clarindo

RG 1091639-3

Anexos:

Doc. 01 – Cópia do Cartão de Vale Transporte do Requerente;

Doc. 02 – Cópia do comprovante de trabalho do Requerente;

Doc. 03 – Cópia do Email ao SINETRAM.